Finanças

Está na hora de reduzir as importações de gás da Rússia – 06/04/2022 – Martin Wolf

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Os relatos de massacres de civis em Butcha, perto de Kiev, infelizmente, não podem ser uma surpresa. Em resposta, Emmanuel Macron afirmou: “O que aconteceu em Butcha exige uma nova rodada de sanções e medidas muito claras, por isso vamos nos coordenar com nossos parceiros europeus, especialmente com a Alemanha”. Ele acrescentou que “sobre petróleo e carvão, devemos poder seguir adiante. Certamente deveríamos avançar nas sanções… não podemos aceitar isto”.

Mas as sanções ao petróleo e o carvão russos são insuficientes. Também é necessário embargar as importações de gás russo. Segundo a Agência de Informação sobre Energia dos EUA, em 2021 74% das exportações de gás natural da Rússia foram para membros europeus da OCDE. Isso representaria 5% dos ganhos do país com exportações.

A diferença entre essas exportações e as de petróleo e carvão é que é mais fácil para a Rússia mudar sua destinação que o do gás, cujo transporte depende de infraestrutura inflexível.

Acrescentar o gás à lista de produtos embargados, portanto, aumentaria os problemas da Rússia. As objeções a essa ideia são que alguns países europeus dependem especialmente do gás russo, e portanto para eles os custos de cortar substancialmente as importações seriam enormes.

Entre os mais vulneráveis estão a Alemanha e a Itália. A Alemanha, por exemplo, depende da Rússia para um terço de seu consumo de energia. Além disso, a Alemanha recebeu 58% de seu gás da Rússia em 2020, enquanto a Itália recebeu 40%. Esses países também dependem muito do gás: o consumo da Alemanha é mais que o dobro do da França, cuja capacidade de geração nuclear é grande. Um embargo ao fornecimento de gás, ao que parece, devastaria a economia alemã e de países igualmente vulneráveis.

Pesquisas econômicas recentes sugerem, no entanto, que esse medo –embora compreensível– é exagerado. Um trabalho sobre a Alemanha feito por economistas encabeçados (na ordem alfabética) por Rudiger Bachmann, da Universidade Notre Dame, observa que o foco deveria ser o gás, já que petróleo e carvão são fornecidos nos mercados globais.

Se necessário, como observa o trabalho, “existe capacidade de mercado mundial suficiente de outros países exportadores de petróleo e carvão para compensar o déficit”. A Rússia também pode transferir suas exportações para outros lugares, embora possa ter que fazê-lo com desconto.

Então, e as sanções sobre o gás? Em curto prazo, a perda do gás russo não poderia ser compensada por importações de outros lugares. O trabalho supõe que o resultado de um embargo à energia russa seria um corte de 30% nas entregas de gás, o que representa cerca de 8% do consumo total de energia da Alemanha.

Os pontos-chave da análise são que a substituibilidade do gás no consumo e na produção é menor no curto prazo do que no longo, e maior em alguns usos do que em outros. Com elasticidades de substituição de curto prazo muito baixas (uma suposição pessimista), um declínio de 8% no consumo de petróleo, gás e carvão leva a uma queda de 1,4% no Produto Interno Bruto –um custo de 500 a 700 euros (cerca de R$ 2.500 a 3.500) por ano para cada cidadão alemão.

Com uma queda de 30% no consumo de gás, as perdas econômicas sobem para 2,2% do PIB (2,3% da despesa nacional bruta) ou 1.000 euros por ano por cidadão. Se considerarmos possíveis efeitos macroeconômicos de segunda ordem, esse impacto pode chegar a 3% do PIB.

Existem outras estimativas. Uma pesquisa de Clemens Fuest, do Instituto Ifo em Munique, apresentada no fórum econômico e financeiro de Ambrosetti no último fim de semana, mostra que as estimativas do declínio do PIB variam entre 0,2% e 6%. Como ele afirma, “nós realmente não sabemos”.

Mas sabemos que se fosse necessário um embargo seria melhor fazê-lo agora: como explica o artigo citado acima, a justificativa “é a sazonalidade da demanda de gás. Um corte do gás russo durante os meses de verão poderia ser substituído por fontes norueguesas e outras, mantendo o abastecimento industrial”. Um movimento precoce também “desencadearia as dinâmicas de substituição e realocação que são centrais para reduzir os custos econômicos”.

Acima de tudo, um embargo abrangente às importações de energia russa para a Europa seria uma declaração de vontade coletiva em defesa dos valores sobre os quais a Europa do pós-guerra foi fundada contra seu inimigo mais feroz.

É dever da Alemanha liderar. Sim, teria custos significativos. Mas as razões pelas quais ela é tão vulnerável são, afinal, o que o economista Hans-Werner Sinn chama corretamente de “fiasco energético da Alemanha”, com o fechamento da energia nuclear e a dependência excessiva da Rússia. Além disso, mesmo nas piores hipóteses, esses custos seriam modestos em comparação com os sofridos durante a crise da zona do euro.

É claro que a Alemanha e outros países vulneráveis devem ser ajudados. O gás disponível deve ser tratado como um recurso europeu, na medida do possível. Seria um gesto magnífico se o Reino Unido aderisse. Também será necessário adotar políticas fiscais que amorteçam o golpe para as pessoas vulneráveis. Além disso, é essencial construir uma infraestrutura que ofereça o máximo de flexibilidade.

O objetivo em longo prazo deve ser que a Europa possa importar de qualquer lugar, enquanto a Rússia continue dependente dos mercados europeus. O objetivo em curto prazo deve ser dificultar ao máximo a vida de Putin. Uma alternativa superior seria a sugestão de Ricardo Hausmann, de Harvard, de um imposto penal sobre as importações russas pela maioria dos compradores, em todo o mundo. Infelizmente, isso não vai acontecer.

É possível que a exigência de pagamento em rublos feita por Putin acabe cortando o fornecimento de qualquer maneira. Mas isso não deve ser necessário. Com ou sem razão, a Otan decidiu não defender a Ucrânia militarmente. O mínimo que os europeus podem fazer é usar todas as outras ferramentas à sua disposição. Eles devem arcar e compartilhar os custos de cortar as importações de energia russas. Devem criar uma política energética que maximize a flexibilidade e a resiliência. É hora de agir.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves


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Fonte: Acesse Aqui o Link da Matéria Original

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