Ciência

Qual é o preço de uma endemia no futuro? – 17/02/2022 – Ciência Fundamental

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Nesses quase três anos de disseminação do vírus da Covid-19, observamos a aceleração surpreendente do avanço científico, com o desenvolvimento de vacinas efetivas e seguras, opções terapêuticas (com evidências científicas) e a validação de táticas cujas probabilidades apontam para uma estratégia de sucesso para o controle – e a saída – de uma pandemia. O cenário que aponta para a saída da pandemia parece estar ganhando uma forma: a perspectiva de uma endemia.

De um modo geral, quando um agente infeccioso se torna endêmico em uma população, ocorre um patógeno recorrente, cujas taxas gerais são estáticas – não aumentam nem diminuem. Ou seja, o número de indivíduos que uma pessoa infectada pode contaminar, também chamado número básico de reprodução do vírus, é muito próximo de 1: cada caso gera em média um novo caso. Para nós, que vivemos um momento em que esses valores são bastante superiores, essa proporção poderia soar praticamente inofensiva, desejável, até. Infelizmente, não há nada inofensivo numa endemia.

Para entender o que é uma endemia, é preciso lembrar das doenças da atualidade que se encaixam nessa categoria. Em 2020, a malária matou mais de 600 mil pessoas na África; no mundo, foram acometidos de tuberculose cerca de 10 milhões de indivíduos, dos quais 1,5 milhão morreram dessa doença. Muitas dessas condições endêmicas ganham gravidade em especial em países de baixa renda, com precárias condições sanitárias e de saúde. Nas palavras do virologista Aris Katzourakis, “endêmico certamente não significa que a evolução de alguma forma ‘domou’ um patógeno para que a vida simplesmente retorne ao normal”. Para Katzourakis, proclamar a proximidade de um cenário endêmico nesse momento pode encorajar uma complacência equivocada, eximindo os tomadores de decisão de uma atuação mais incisiva sobre nossa realidade.

Políticas de saúde pública devem seguir embasadas no conhecimento científico disponível, com ações coordenadas que promovam o avanço e a ampliação da vacinação, o uso de máscaras adequadas, além do distanciamento físico e a preferência por ambientes abertos e bem ventilados. Uma vez estabelecido, e seguido, esse protocolo, que já foi divulgado à exaustão pelos veículos de comunicação, poderemos determinar uma possível forma da endemia da Covid-19. O que se fizer agora será crucial para o modo como viveremos essa endemia.

A situação atual também pode nos direcionar a um caminho que preservará a pandemia: a alta transmissão observada pela presença de novas variantes do vírus traz riscos até mesmo para regiões de maior cobertura vacinal. Mesmo que uma região atinja um equilíbrio – seja de baixos ou altos números de casos e óbitos –, essa estabilidade pode ser perturbada com o surgimento de uma nova variante, com novas características. Não é a primeira pandemia que enfrentamos, mas parece que ainda não aprendemos com nossa história.

O pensamento de que a endemicidade é leve e inevitável é perigoso, pois poderemos ter de encarar ainda muitos anos de doença e ondas imprevisíveis de novos casos. Precisamos entender que o caminho mais seguro é não dar oportunidades para o vírus se transmitir, pois ele sempre irá buscar uma adaptação. Fazendo isso, investiremos na melhor estratégia possível: prevenir que um cenário pior aconteça.

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Mellanie Fontes-Dutra, biomédica, pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (RS) e coordenadora da Rede Análise Covid-19.

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Fonte: Acesse Aqui o Link da Matéria Original

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