Polarização política desafia jornalismo sobre ambiente – 27/07/2022 – Lúcia Guimarães
Uma pesquisa recente do instituto Pew Research Center mostrou que a vasta maioria dos americanos apoia novas medidas de combate ao aquecimento do planeta.
Mais de dois terços são a favor de incentivos para o uso de veículos elétricos ou híbridos e da criação de impostos para corporações com base em suas emissões de carbono. Nova regulação obrigando o aumento do uso de energia de recursos renováveis teria o apoio de 72%, e 79% favorecem incentivos fiscais do governo para ajudar empresas em projetos de captura e armazenamento de carbono.
A preocupação com o ambiente vem crescendo na última década e, em junho, uma pesquisa da empresa YouGovAmerica revelou que hoje 56% da população se identifica como “ambientalista”. Então, por que só 30% dos americanos se dizem interessados em acompanhar notícias sobre o meio ambiente?
A polarização política nos EUA —e também a corrupção de políticos comprados por interesses especiais— ajudam a explicar como o país está rachado ao meio no apoio à encolhida agenda ambiental de Joe Biden, que sofre assaltos não só de ultraconservadores na Suprema Corte como do próprio partido. O senador Joe Manchin, da Virgínia Ocidental, vendido ao lobby do carvão, deu o tiro de misericórdia que matou, neste mês, um pacote legislativo ambiental ligado ao plano BBB (Build Back Better).
É difícil manter a atenção do público já assediado por más notícias sobre economia e saúde com previsões apocalípticas. Mas os desinformados, consumindo uma dieta negacionista como a servida nos EUA pela Fox News, não são os maiores responsáveis pela falta de apoio ao combate ao aquecimento global; são os narradores da mídia que tratam a ciência como ideologia.
A agência federal de ambiente dos EUA foi criada por Richard Nixon, um conservador cristão. O correspondente do setor da rede CNN comparou recentemente os âncoras da rede de Rupert Murdoch a sabotadores que bloqueiam a saída de um teatro pegando fogo.
Se o jornalismo quer ser tratado como serviço público, cabe ao jornalismo contribuir melhor para desembaralhar a falácia de que a ciência ambiental é “de esquerda”. Se no primeiro semestre de 2020 a catástrofe da pandemia jogou repórteres de todos os setores na cobertura de um vírus, chegou a hora de parar de setorizar a reportagem de ambiente.
Toda a cobertura tem um aspecto ambiental num mundo em que eventos relacionados ao clima já matam 5 milhões por ano e devastam economias de qualquer porte.
Um obstáculo evidente é que a reportagem científica requer um grau maior de especialização. Outro é articular melhor o relato de fatos no contexto da destruição ambiental. O comentarista financeiro que descreve só as cifras quando o governo precisa intervir no mercado de seguros da Luisiana porque as tempestades e furacões tornaram 600 mil residências inafiançáveis não deve omitir como a ciência explica a debacle econômica.
A narrativa ambiental nunca teve à disposição tantas notícias promissoras com o progresso científico na proteção ambiental. Equilibrar o noticiário entre os sacrifícios e as recompensas é um poder que o jornalismo tem de resgatar a ciência refém dos autocratas populistas.
Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência.
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